espera e paciência
A espera tem como perigo maior a impaciência. Por isso a fé é, em certo sentido, a esperança ilimitada que se trilha com a paciência de viver acreditando.
A espera tem como perigo maior a impaciência. Por isso a fé é, em certo sentido, a esperança ilimitada que se trilha com a paciência de viver acreditando.
O filósofo alemão Ernest Bloch (para quem a morte era a mais forte não-utupia…) gastou a sua vida numa empreitada séria, profunda e coerente, mas, ao mesmo tempo, algo frustrante. A sua tese de uma “esperança sem deus” tem, para mim, um efeito boomerang: a nossa finitude acaba por nos levar a uma esperança que depende, precisamente, do reconhecimento de um Deus amoroso, criador… e ‘esperançador’…
Há uma quase luta entre as receções que somos convidados a colher e a viver e certo legítimo abatimento por aquilo que vai faltar ou já falta. A fé é a arte de viver que nos vai treinando para valorizar mais a confiança dos primeiros impulsos de esperança do que a desconfiança face aquilo que ainda não é…
Na liturgia católica romana deste fim de semana escuta-se Lc 21, 25-28.34-36
«A vossa libertação está próxima»
Começa para os cristãos católicos romanos o chamado tempo de Advento, de espera, de esperança e, em certo sentido, de preparação para os brotares do tempo. Os ciclos litúrgicos são um ritual ajudante, uma pedagogia, um convite de consciencialização comunitária para os movimentos do espaço, do tempo e do espírito. Mas estes ciclos maiores reproduzem-se no dia-a-dia. Hoje mesmo, na linha do texto proposto, provavelmente, vou viver sinais fantásticos que a natureza me oferecer, vou viver angústias interiores e exteriores, vou-me ver lançado em dilemas complexos, vou deixar-me provocar por esperanças, encontros e desencontros. Vou, com toda a certeza, fazer pontes de Páscoa, em que mortes geram vida. Portanto, o Advento, o Natal, a Quaresma, o Tempo Comum e a Páscoa, são, mais do que ciclos litúrgicos, ciclos de vida quotidiana. Preparar, vigiar e dar toques de esperança e de futuro ao que sou e ao que faço, isso é vida, isso é Advento…
Paira sempre uma certa desconfiança existencial, por via da fragilidade, do sofrimento e até da morte que espreitam e se antecipam. A fé é o avesso disto, é o primado da confiança, apesar do que falta…
Na liturgia católica romana deste fim de semana escuta-se Act 1, 1-11
«Homens da Galileia, porque estais a olhar para o Céu? Esse Jesus, que do meio de vós foi elevado para o Céu, virá do mesmo modo que O vistes ir para o Céu».
O Céu – escrito assim com um ‘C’ grande – supera qualquer realidade física, simbolizando uma ‘lugar-outro’, fora deste tempo e deste espaço, que nos transcende amorosamente. É verdade que nas possíveis hermenêuticas passadas e algumas ainda presentes, marcadas por uma compreensível aproximação menos sistémica, o Céu e o céu espacial se confundiam, numa cosmovisão teológica ingenuamente realista. Hoje, com vantagem para os crentes, diria, ainda que sem superioridade nem histórica nem cultural e com a mesma consciência da nossa cegueira, o Céu que importa é o da esperança. Jesus, precisamente a esperança dos cristãos, está lá e está cá, foi elevado e virá. Foi, é, será e, principalmente, está a vir, também na minha vida, também com as minhas mãos…
DEUS
Parti da aridez
do deserto.
Saltei para
o escuro.
Apostei sem ver.
Mergulhei
em mar
de dúvida.
Procurei.
Progredi apalpando
e sem sentir.
Pensei, forcei
caminhei
de olhos vendados.
Eis que caio
num banho de
mel.
Quente,
sensual,
real.
Mais óbvio que eu.
Setenta vezes
os cinco sentidos.
Certeza
Deus.
Ele, que sempre
estivera,
era mais forte
que tudo.
…in Paiva, J. C. (2000), Este gesto de Ser (poesia), Edições Sagesse, Coimbra.
acessível aqui
Na liturgia católica romana deste fim de semana escuta-se 1 Cor 12, 31
«Agora permanecem a fé, a esperança e a caridade; mas a maior de todas é a caridade»
As “trilogias” no cristianismo são muito frequentes (desde logo a centralidade no Pai, no Filho e no Espírito Santo…). Fixemo-nos nesta tão conhecida do apóstolo Paulo, “fé, esperança e caridade”. Para melhor ajuste linguista contemporâneo, podemos “traduzir” caridade por amor, e tomar esta tríade como verdadeira lupa de avaliação crítica e modo de ação. A pergunta crucial: nas minhas relações, cresce a fé, a esperança e o amor? na minha família, cresce a fé, a esperança e o amor? na minha vida, cresce a fé a esperança e o amor?… sabemos, sentimos e experimentamos, que muitas vezes, nos falta fé e esperança. Mas o ‘maior de tudo’, sempre possível de ensaiar, é o amor…