Acreditar

ACREDITAR

Às vezes penso que só creio

porque não sei não crer.

Cobardia esta

a de não deixar

de olhar assim.

Sou gota de água:

ínfimo e

frágil.

Escorrego

não me aguento

e caio na

terra seca

que me criou.

…in Paiva, J. C. (2000), Este gesto de Ser (poesia), Edições Sagesse, Coimbra.

acessível aqui

JP in Espiritualidade Poemas 20 Junho, 2019

Verdade, Ciência e Religião

A Ciência e a Religião partilham pelo menos uma abordagem ao (complexo) conceito de Verdade: ambas se alimentam do mistério que envolve essa mesma Verdade e sabem-na, intrinsecamente, inalcançável.

J. C. Paiva, Verdade, Ciência e Religião. Site PontoSJ (que se recomenda…). 2 de março de 2018.

https://pontosj.pt/opiniao/verdade-ciencia-religiao/

 

Verdade, Ciência e Religião

Sempre que falamos de ciência e religião teremos de ter em conta que as pontes a lançar não deverão violar a consciência de que, uma e outra, possuem diferentes metodologias. Será interessante colocar em diálogo o que é diferente e atender a uma certa artificialidade compartimentalista, que está subjacente à criação humana das várias disciplinas. Mas nunca pisando o risco de chamar igual ao que se distingue e muito menos usar a mesma malha metodológica para “pescar peixe” diferente. Por isto mesmo, a palavra-chave entre ciência e religião nunca é inferência. A palavra inferência, no seu sentido lógico, remete-nos para afirmações de verdade deduzidas a partir de outras proposições consideradas verdadeiras. Ora, é este o terreno pantanoso da relação entre ciência e religião, observável, por exemplo, na conhecida teoria do “design Inteligente”, que, a partir de algumas evidências científico-biológicas induz afirmações de caráter religioso e vice-versa.

Ao contrário das inferências, podemos, isso sim, com eventual vantagem pedagógica, usar algumas analogias. As analogias são fundamentais na comunicação e na compreensão de muitos processos e conceitos. Usamo-las, inúmeras vezes, sem nos apercebermos. O dinamismo das analogias pressupõe um conceito alvo (onde se quer chegar) e um conceito análogo (de onde se parte). Estabelecem-se então pontes e relações que podem ajudar a clarificar alguns assuntos. Convém referir que as analogias são sempre não perfeitas e, sem exceção, apresentam pontos frágeis.

A procura da Verdade (neste texto deliberadamente escrita em maiúscula) é um assunto mobilizador em toda a nossa história cultural e mantém-se como ponto de interesse na atualidade.

A grande maioria dos cientistas reconhecerá que, em certo sentido, procura a Verdade. Muitos pensadores dedicam-se a tentar conhecer melhor como se processa o próprio conhecimento científico. Para Karl Popper, por exemplo, será preferível dizer que o que procuramos ao fazer ciência é afastar-nos do erro, sendo que, quanto mais esse caminho é trilhado, mais assuntos existem por conhecer.

A Ciência e a Religião partilham, pelo menos, uma abordagem ao (complexo) conceito de Verdade: ambas se alimentam do mistério que envolve essa mesma Verdade e sabem-na, intrinsecamente, inalcançável.

O confronto com o conceito de Verdade leva-nos à encíclica de Bento XVI, Caritas in Veritate. Ali, podemos assumir, confunde-se a própria Verdade com o amor (versão porventura mais “fresca” da palavra caridade). Acontece, porém, que o amor é, ele próprio, indizível, porquanto é identificável com a transcendência, mais do que um seu atributo. Um apontamento para o amor seria tomá-lo como a fonte de uma explicitação radical: “tu podes ser tu diante de mim”. Este primado de aceitação do outro, sinalizado (encarnado?) na relação de Deus com os homens e, assim, entre eles mesmos, tem alguma analogia com a forma como a ciência lida, aceita e tenta desvendar a realidade natural.

Um apontamento de Verdade para os católicos seria a própria tradição. Também aqui há alguma analogia com a ciência, que se faz com “gigantes aos ombros de gigantes”. Estas são palavras de Newton. Com efeito, um cientista acrescenta à ciência sempre a partir do que outros disseram e descobriram e não empreende qualquer investigação sem a respetiva revisão de literatura. Neste sentido, a ciência também se funda na tradição. Há um conjunto de regras de comunicação e ações que são respeitadas pela comunidade científica e que permitem consensos e progressos notáveis. Dir-se-á que a ciência está, ao contrário da religião, sacudida de dogmas de partida. Mas essa colocação é duvidosa… Há pressupostos essenciais na empresa científica, sempre latentes ao longo da sua própria génese e história. Nomeadamente, há ciência porque: 1) entendemos que a realidade existe; 2) entendemos que é possível conhecer a realidade e 3) entendemos que é bom conhecer a realidade. Dogma maior, qual crença, seria o de que existe unicamente o que é materializado e que apenas os óculos da ciência conseguem ver lucidamente o mundo.

A tradição da Igreja, porém, não é um fim em si própria, nem, tão pouco, se lhe pode subtrair o dinamismo de linguagem e atualização. A tradição vale na medida exata em que não é defendida como um projeto enterrado mas antes como um tesouro vivo, redito e religado com a realidade…

Poderemos ainda envolver a questão das emoções e dos sentimentos, cruzada cada vez mais com as nossas próprias virtudes e limitações biológicas. O nosso cérebro tem, à partida, tantas potencialidades quanto constrangimentos: face a um objeto, capta certa realidade (tateia?) mas, imediatamente, fica aquém de um certo sentido de totalidade, que é próprio da Verdade.

A Verdade, isso parece inequívoco, não será monopólio da ciência (cientificismo) nem de ninguém. Andará em espaços de uma tensão incontornável do próprio sentido da vida humana, algures entre a imanência das coisas (realidade) e as entrelinhas do mistério (transcendência).

Ele vos guiará para a verdade plena

Na liturgia católica romana deste fim de semana escuta-se Jo 16, 12-15

«Ele vos guiará para a verdade plena»

Temos no Evangelho de hoje uma alusão à Santíssima Trinda
de: ” Tudo o que o Pai tem é Meu”, diz Jesus, ao mesmo tempo que refere que o “Espírito Santo nos falará de Si próprio”, deste amor inteiro entre o Pai e o Filho. Entre outras imagens ricas do Espírito Santo, como a pomba da paz ou a água do Baptismo, temos este “qualquer coisa” que transporta um amor imenso, como o que existe entre o Pai e o Seu Filho. Se falta amor em alguma das nossas relações, ouçamos o Espírito Santo que nos convida a um coração que se doa e que recebe, como acontece entre Jesus e o Seu Pai. Convém notar que a simbologia entre Pai e filho é a possível face à indizibilidade da relação plena de Deus, mas é sempre intrinsecamente incompleta e imperfeita, já que os pais e filhos que somos ou conhecemos, podendo amar-se, (ainda) não amam como Deus ama, com tão radical gratuitidade e risco amoroso…

JP in Espiritualidade Frases 16 Junho, 2019

como um recém nascido…

Vejo Deus como um bébé quando nasce: olhos turvos do lado de cá, uma mancha apenas, excesso de luz e de amor. Terei de crescer, deixar-me abraçar e alimentar… para ver melhor. Mas como é bom e vital este aconchego … e a vida que me foi dada.

JP in Espiritualidade Frases 14 Junho, 2019

o simples e o complexo em educação…

Há uma tensão constante entre aprofundar uma ideia e aligeirá-la. Por um lado, é missão do professor, precisamente, simplificar, mas, por outro lado, há simplificações que são simplistas e comprometem a verdadeira percepção da realidade, que é tipicamente complexa…

A procura docente bem se poderia resumir no equilibrio dinâmico destes dois pólos: o simples e o complexo…

JP in Educação Frases 12 Junho, 2019

fé e razão

Não há um caminho exclusivamente racional para compreender a fé e, muito menos, para se ser religioso. A religião e a ciência, neste sentido, têm objectivos e caminhos diferentes. O que não significa que a fé não tenha também uma dimensão racional. A racionalidade humana não se reduz à racionalidade científica. As crenças humanas dignas de crédito não são só as que se baseiam neste género de racionalidade científica. Muitas das crenças humanas nas quais se fundamenta a vida das pessoas comuns radicam no testemunho e no crédito que dão umas às outras. Não são o resultado positivo de qualquer teste científico a que essas crenças sejam submetidas…

JP in Ciência Espiritualidade Frases 10 Junho, 2019

enviai, Senhor, o vosso Espírito e renovai a face da terra

Na liturgia católica romana deste fim de semana escuta-se Slm 103

«Enviai, Senhor, o vosso Espírito e renovai a face da terra»

Há no salmo que hoje rezamos liturgicamente um rasgo interessante no judaico-cristianismo: trata-se duma cumplicidade entre o Espírito e a terra, entre o transcendente e o imanente. Uma fusão entre o real e o sagrado. “Esticando a corda” da inspiração, com intenção deliberadamente catequética, potencialmente ajustadora de religiosidades muito etéreas, de misticismo duvidoso e desligadas da vida, seria bom colocarmo-nos na senda de escutantes do Espírito Santo que, claramente, fala na e pela realidade. Dentro e fora do fenómeno religioso, vou ficando com a ideia de que se apostam em simbolismos mais ou menos mágicos, desligados do que somos. Pelo contrário, o sopro dá-se na matéria e os sinais da sede do Espírito topam-se numa terra que comunica…

JP in Espiritualidade Frases 8 Junho, 2019

não somos os nossos pensamentos…

Nós somos também o que pensamos mas somos mais do que pensamos (como somos mais do que aquilo que fazemos…).

Uma leitura interessante a fazer face a muitas das nossas autoprisões é, precisamente, observarmos como nos tornamos reféns do que pensamos, como se fossemos o que pensamos…

Há depois pequenos ‘truques’ de gestão de pensamentos, como “aceitá-los como um hóspede”, “não julgar os pensamentos” ou “colocá-los numa novem… em standby“…

JP in Educação Espiritualidade Frases 6 Junho, 2019

“redizentes”…

Académicos ou curiosos, especialistas ou leigos, somos sempre mais “redizentes” do que inventores (humildade socrática elementar…)

JP in Frases 4 Junho, 2019

a escola face ao esforço e o prazer

A tendência para fazer da escola um espaço agradável e propício à aprendizagem foi-se cimentando nas práticas educativas contemporâneas. O farol da motivação, dos recursos gráficos, das actividades lúdicas e das auto-aprendizagens foi aparecendo, cada vez mais, na mira dos educadores, abandonando-se aos poucos a aprendizagem enfadonha e de mero sacrifício. Mas será possível educar e ajudar a crescer sem esforço, sem sacrifício, sem «dor»? Será bom para um aprendiz não tolerar, em dose equilibrada, a frustração, o exercício repetitivo, a prática sistemática, a contenção de emoções e a “obediência”?…