identidade católica romana…

Compreendem-se criticamente as atitudes mais fechadas e identitárias de alguns católicos romanos: o fechado, rígido e militante é aparentemente seguro… Mas, “nas coisas do alto (…)”, não há lugar para sonhos baixos, instalados e mesquinhos. A identidade religiosa afirma-se no diálogo radical, mimetizando, aliás, um Jesus Cristo que frequentava lugares duvidosos e tinha pouco de formalidade religiosa. Também do ponto de vista da identidade religiosa nos havemos de render ao radical diálogo, iluminado pelo convite bíblico mais libertador: é preciso perder para ganhar…

JP in Espiritualidade Frases 2 Julho, 2019

Senhor: queres que mandemos descer fogo do céu que os destrua?

Na liturgia católica romana deste fim de semana escuta-se Lc 9, 51-62

«Senhor: queres que mandemos descer fogo do céu que os destrua?»

Jesus e os discípulos dirigiram-se a uma povoação na Samaria, não tendo sido bem recebidos. Tiago e João, ou por amarem e quererem defender o Mestre, ou por certa imaturidade no amor, logo sugeriram: “Senhor: queres que mandemos descer fogo do céu que os destrua?”. Jesus, porém, repreendeu-os. Há na nossa vida e principalmente no nosso interior, laivos parecidos com a aproximação de Tiago e João. São os nossos cenários imaginados (às vezes com sequência), em que bem desejaríamos surdas vinganças e insucessos para aqueles que nos recebem mal. O primeiro passo na gestão da nossa interioridade é a assunção e mesmo a autovalidação. Curto-circuitar o que sentimos e o que na realidade somos, incluindo os nossos pensamentos, com um tamponamento moral, não é normalmente libertador. Posto isso, trabalhar interiormente e apostar neste não rancor, é estar em sincronia com Jesus.

JP in Espiritualidade Frases 30 Junho, 2019

ironia ao natural

Ironia ao natural

 

É natural,

é bom

e quanto mais melhor,

como os cogumelos

vermelhos,

as rãs azuis

ou o suco de serpente…

É químico,

processado,

é mau,

como a

aspirina,

um perfume

ou o plástico

da válvula

cardíaca

de um coração…

in Paiva, J. C., Quase poesia quase química (2012) (e-book). Lisboa, Sociedade Portuguesa de Química.

acessível aqui (porventura enriquecido com uma ilustração)

JP in Ciência Poemas Química 28 Junho, 2019

espiralidade bíblica…

É impressionante como as temáticas bíblicas se aprofundam em espiral e se revisitam e se redizem sucessivamente. Muitas vezes, particularmente nos Evangelhos, certa passagem diz-nos, por via de um aparente detalhe, todo o Evangelho. Em certo sentido, se quiséssemos saber dos critérios de Jesus, sem prejuízo de um necessário olhar sistémico, bastaria olharmos a forma como lava os pés aos discípulos, como liberta (e nos liberta…) a mulher adúltera, como se acolhe o filho pródigo ou como se paga ao trabalhador de última hora…

JP in Espiritualidade Frases 26 Junho, 2019

humildade radical

De todas as urgências existênciais há um lugar especial para a radical humildade: constatar e estar atento e consciente face à autocegueira intrínseca, no que diz respeito ao conhecimento do mundo, à espiritualidade, às próprias virtudes…

JP in Educação Espiritualidade Frases 24 Junho, 2019

Acreditar

ACREDITAR

Às vezes penso que só creio

porque não sei não crer.

Cobardia esta

a de não deixar

de olhar assim.

Sou gota de água:

ínfimo e

frágil.

Escorrego

não me aguento

e caio na

terra seca

que me criou.

…in Paiva, J. C. (2000), Este gesto de Ser (poesia), Edições Sagesse, Coimbra.

acessível aqui

JP in Espiritualidade Poemas 20 Junho, 2019

Verdade, Ciência e Religião

A Ciência e a Religião partilham pelo menos uma abordagem ao (complexo) conceito de Verdade: ambas se alimentam do mistério que envolve essa mesma Verdade e sabem-na, intrinsecamente, inalcançável.

J. C. Paiva, Verdade, Ciência e Religião. Site PontoSJ (que se recomenda…). 2 de março de 2018.

https://pontosj.pt/opiniao/verdade-ciencia-religiao/

 

Verdade, Ciência e Religião

Sempre que falamos de ciência e religião teremos de ter em conta que as pontes a lançar não deverão violar a consciência de que, uma e outra, possuem diferentes metodologias. Será interessante colocar em diálogo o que é diferente e atender a uma certa artificialidade compartimentalista, que está subjacente à criação humana das várias disciplinas. Mas nunca pisando o risco de chamar igual ao que se distingue e muito menos usar a mesma malha metodológica para “pescar peixe” diferente. Por isto mesmo, a palavra-chave entre ciência e religião nunca é inferência. A palavra inferência, no seu sentido lógico, remete-nos para afirmações de verdade deduzidas a partir de outras proposições consideradas verdadeiras. Ora, é este o terreno pantanoso da relação entre ciência e religião, observável, por exemplo, na conhecida teoria do “design Inteligente”, que, a partir de algumas evidências científico-biológicas induz afirmações de caráter religioso e vice-versa.

Ao contrário das inferências, podemos, isso sim, com eventual vantagem pedagógica, usar algumas analogias. As analogias são fundamentais na comunicação e na compreensão de muitos processos e conceitos. Usamo-las, inúmeras vezes, sem nos apercebermos. O dinamismo das analogias pressupõe um conceito alvo (onde se quer chegar) e um conceito análogo (de onde se parte). Estabelecem-se então pontes e relações que podem ajudar a clarificar alguns assuntos. Convém referir que as analogias são sempre não perfeitas e, sem exceção, apresentam pontos frágeis.

A procura da Verdade (neste texto deliberadamente escrita em maiúscula) é um assunto mobilizador em toda a nossa história cultural e mantém-se como ponto de interesse na atualidade.

A grande maioria dos cientistas reconhecerá que, em certo sentido, procura a Verdade. Muitos pensadores dedicam-se a tentar conhecer melhor como se processa o próprio conhecimento científico. Para Karl Popper, por exemplo, será preferível dizer que o que procuramos ao fazer ciência é afastar-nos do erro, sendo que, quanto mais esse caminho é trilhado, mais assuntos existem por conhecer.

A Ciência e a Religião partilham, pelo menos, uma abordagem ao (complexo) conceito de Verdade: ambas se alimentam do mistério que envolve essa mesma Verdade e sabem-na, intrinsecamente, inalcançável.

O confronto com o conceito de Verdade leva-nos à encíclica de Bento XVI, Caritas in Veritate. Ali, podemos assumir, confunde-se a própria Verdade com o amor (versão porventura mais “fresca” da palavra caridade). Acontece, porém, que o amor é, ele próprio, indizível, porquanto é identificável com a transcendência, mais do que um seu atributo. Um apontamento para o amor seria tomá-lo como a fonte de uma explicitação radical: “tu podes ser tu diante de mim”. Este primado de aceitação do outro, sinalizado (encarnado?) na relação de Deus com os homens e, assim, entre eles mesmos, tem alguma analogia com a forma como a ciência lida, aceita e tenta desvendar a realidade natural.

Um apontamento de Verdade para os católicos seria a própria tradição. Também aqui há alguma analogia com a ciência, que se faz com “gigantes aos ombros de gigantes”. Estas são palavras de Newton. Com efeito, um cientista acrescenta à ciência sempre a partir do que outros disseram e descobriram e não empreende qualquer investigação sem a respetiva revisão de literatura. Neste sentido, a ciência também se funda na tradição. Há um conjunto de regras de comunicação e ações que são respeitadas pela comunidade científica e que permitem consensos e progressos notáveis. Dir-se-á que a ciência está, ao contrário da religião, sacudida de dogmas de partida. Mas essa colocação é duvidosa… Há pressupostos essenciais na empresa científica, sempre latentes ao longo da sua própria génese e história. Nomeadamente, há ciência porque: 1) entendemos que a realidade existe; 2) entendemos que é possível conhecer a realidade e 3) entendemos que é bom conhecer a realidade. Dogma maior, qual crença, seria o de que existe unicamente o que é materializado e que apenas os óculos da ciência conseguem ver lucidamente o mundo.

A tradição da Igreja, porém, não é um fim em si própria, nem, tão pouco, se lhe pode subtrair o dinamismo de linguagem e atualização. A tradição vale na medida exata em que não é defendida como um projeto enterrado mas antes como um tesouro vivo, redito e religado com a realidade…

Poderemos ainda envolver a questão das emoções e dos sentimentos, cruzada cada vez mais com as nossas próprias virtudes e limitações biológicas. O nosso cérebro tem, à partida, tantas potencialidades quanto constrangimentos: face a um objeto, capta certa realidade (tateia?) mas, imediatamente, fica aquém de um certo sentido de totalidade, que é próprio da Verdade.

A Verdade, isso parece inequívoco, não será monopólio da ciência (cientificismo) nem de ninguém. Andará em espaços de uma tensão incontornável do próprio sentido da vida humana, algures entre a imanência das coisas (realidade) e as entrelinhas do mistério (transcendência).

Ele vos guiará para a verdade plena

Na liturgia católica romana deste fim de semana escuta-se Jo 16, 12-15

«Ele vos guiará para a verdade plena»

Temos no Evangelho de hoje uma alusão à Santíssima Trinda
de: ” Tudo o que o Pai tem é Meu”, diz Jesus, ao mesmo tempo que refere que o “Espírito Santo nos falará de Si próprio”, deste amor inteiro entre o Pai e o Filho. Entre outras imagens ricas do Espírito Santo, como a pomba da paz ou a água do Baptismo, temos este “qualquer coisa” que transporta um amor imenso, como o que existe entre o Pai e o Seu Filho. Se falta amor em alguma das nossas relações, ouçamos o Espírito Santo que nos convida a um coração que se doa e que recebe, como acontece entre Jesus e o Seu Pai. Convém notar que a simbologia entre Pai e filho é a possível face à indizibilidade da relação plena de Deus, mas é sempre intrinsecamente incompleta e imperfeita, já que os pais e filhos que somos ou conhecemos, podendo amar-se, (ainda) não amam como Deus ama, com tão radical gratuitidade e risco amoroso…

JP in Espiritualidade Frases 16 Junho, 2019

como um recém nascido…

Vejo Deus como um bébé quando nasce: olhos turvos do lado de cá, uma mancha apenas, excesso de luz e de amor. Terei de crescer, deixar-me abraçar e alimentar… para ver melhor. Mas como é bom e vital este aconchego … e a vida que me foi dada.

JP in Espiritualidade Frases 14 Junho, 2019

o simples e o complexo em educação…

Há uma tensão constante entre aprofundar uma ideia e aligeirá-la. Por um lado, é missão do professor, precisamente, simplificar, mas, por outro lado, há simplificações que são simplistas e comprometem a verdadeira percepção da realidade, que é tipicamente complexa…

A procura docente bem se poderia resumir no equilibrio dinâmico destes dois pólos: o simples e o complexo…

JP in Educação Frases 12 Junho, 2019