Não penseis que vim revogar a Lei ou os Profetas; não vim revogar, mas completar

Na liturgia católica romana deste fim de semana escuta-se Mt 5, 17-

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«Não penseis que vim revogar a Lei ou os Profetas; não vim revogar, mas completar»

Uma das dicotomias mais evidentes do cristianismo é aquela entre continuidade e descontinuidade. Não é possível ver, ler e relacionar-se com Jesus sem este lastro tensional entre continuar e descontinuar. Pode dizer-se de outro modo: herdar e recriar, tradição e inovação… ou manter versus revolucionar. O judaico-cristianismo é o mar desta sinfonia. Se nos cruzarmos com os evangelhos não podemos ficar indiferentes ao sentido descontinuista de Jesus de Nazaré: as suas denúncias do que está mal, as suas constantes críticas religiosas, o sentido crítico do legalismo, a forma como quase sempre “vira de pernas para o ar” o status quo. Por outro lado, Jesus assume-se como Judeu que é, encarna no fio da história e entra na viagem do tempo e do espaço. A morte por amor, e morte de cruz, pode ser lida como a verdadeira revolução (ressurreição) na continuidade do que somos (morrentes). A cada um de nós, por inspiração cristã, cabe discernir onde quebramos e onde continuamos, para dar sentido à nossa vida a à vida do mundo. Os extremos, quer personologicamente, quer socio-politicamente, serão tipicamente menos cristãos e humanos. A radicalidade que importa é outra coisa: é a radicalidade desse mesmo discernimento amoroso…

L 1 Sir 15, 16-21 (15-20); Sl 118 (119), 1-2. 4-5. 17-18. 33-34
L 2 1Cor 2, 6-10
Ev Mt 5, 17-37 ou Mt 5, 20-22a. 27-28. 33-34a. 37

JP in Sem categoria 12 Fevereiro, 2023

idade média e atraso

Um dos «mitos» dos nossos tempos, que tem vindo a ser esclarecido, é entender a Idade Média como estagnação. É hoje consensual que a Idade Média (cerca de mil anos da nossa história), conhecida, por vezes, como «Idade das Trevas», não foi tão estática ou retrógrada quanto isso. Temos de nos colocar nos devidos contextos culturais para compreendermos melhor a razão de ser dos factos históricos. Durante esses anos o Homem fez o que lhe foi possível, com os conhecimentos, tecnologias, critérios e possibilidades da época. São impressionantes, por exemplo, os desenvolvimentos a nível da linguagem. A língua portuguesa (e muitas outras europeias) nasceu e cresceu, no seu essencial, durante a Idade Média. Nesta mesma fase longa da nossa história se estabeleceram as bases para a eclosão da ciência, tal qual a conhecemos hoje.

JP in Sem categoria 10 Fevereiro, 2023

o que é a ciência?

Falta a muitos cientistas uma profundidade elementar sobre a ciência que praticam. A inevitabilidade epistemológica (a pergunta “o que é a ciência?”) é tao fulcral e inesgotável para um cientista como é para todos os humanos a pergunta existencial “quem sou eu?” …

JP in Sem categoria 8 Fevereiro, 2023

baleia e carapau…

Às vezes distraio-me na comparação da minha realidade cultural ou estética com outra qualquer. Inspira-me aquela simples pergunta: “será uma baleia mais importante que um carapau?”…

JP in Sem categoria 6 Fevereiro, 2023

apresentei-me diante de vós cheio de fraqueza e de temor

Na liturgia católica romana deste fim de semana escuta-se Cor 2, 15

«apresentei-me diante de vós cheio de fraqueza e de temor»

É curioso reparar na explicitação de Paulo em relação aos seus sentimentos e emoções enquanto protagonista da atividade apostólica. Ele não se reconheceria como o ‘herói de Cristo’, sem mácula e sem dúvidas, mas o ser frágil que se faz forte pela esperança e não pela impecabilidade. “Não me apresentei com sublimidade de linguagem ou sabedoria”, diz Paulo, como que dizendo que para se ser apóstolo não é preciso dons extraordinários mas antes humildade e confiança, fé num Deus que é amor e que se quer revelar a todos, por via de cada um de nós. A experiência de seguimento cristão poderá tornar-nos, em certo sentido, ‘maiores do que nós mesmos’. Mas o ponto de partida desse crescimento é, precisamente, a consciência de fraqueza e de fragilidade.

NOTA: Este texto é repetido/ajustado a partir de evento já publicado neste blog anteriormente.

Na folha seguinte a grelha de feito/não feito.

L 1 Is 58, 7-10; Sl 111 (112), 4-5. 6-7. 8a e 9
L 2 1Cor 2, 1-5
Ev Mt 5, 13-16

JP in Sem categoria 4 Fevereiro, 2023

Homilia para este domingo – bem aventurados somos

Paiva, J. C. (2023). Homilia para este domingo – bem aventurados somosSite Ponto SJ, 29-01-2023.

Disponível aqui

A liturgia deste domingo começa com um belo trecho de Sofonias. Os versículos fazem parte de uma passagem maior, na qual o profeta alerta o povo de Judá para se arrepender e voltar para Deus. Exorta-se o Senhor com humildade, retidão e obediência aos seus mandamentos. O apóstolo Paulo, por sua vez, na Epístola aos Coríntios, enfatiza que os membros da igreja não se devem orgulhar de seu estatuto social ou da sua sabedoria mundana, porque a verdadeira sabedoria e poder vêm de Deus. Paulo lembra-nos que fomos escolhidos por Deus não por mérito próprio, mas por causa da graça de Deus.

No Novo Testamento (Mateus 5:1-12) somos inspirados pelo conhecido Sermão da Montanha. Nesta passagem, Jesus ensina sobre a natureza da justiça e como ela excede a dos escribas e fariseus. Ele introduz o conceito de “bem-aventuranças”, que são bênçãos para todos: os pobres de espírito, os que choram, os mansos, os que têm fome e sede de justiça, os misericordiosos, os puros de coração, os pacificadores e os perseguidos por causa da justiça. Esta passagem é central na vida cristã.

O “pobre de espírito” é um termo usado em Mateus e centra-se numa das crucias bem-aventuranças.  “Bem-aventurados os pobres de espírito, porque deles é o reino dos céus”. Esta frase é muitas vezes interpretada como referindo-se à humildade e ao reconhecimento da própria pobreza ou carência espiritual. Sugere que aqueles que são humildes e reconhecem a sua própria necessidade de Deus e nutrição espiritual serão recompensados ​​com o reino dos céus. Ser pobre de espírito não é ser economicamente pobre, mas significa reconhecer a própria pobreza espiritual e dependência de Deus, e buscar a justiça, que é a chave para o Reino de Deus.

O Sermão da Montanha contém muitos ensinamentos relevantes para a vida diária:

• Humildade: Jesus ensina que os humildes serão exaltados e os que se exaltam serão humilhados. Na vida real, a humildade pode ser demonstrada por estar disposto a servir os outros, por estar aberto a comentários e críticas e por estar disposto a admitir quando estamos errados.

• Perdão: Jesus ensina que devemos perdoar os outros como fomos perdoados. Na vida real, o perdão pode ser difícil, mas é importante para deixar de lado a raiva e a amargura e manter relacionamentos saudáveis ​​com os outros.

• Amor aos inimigos: Jesus ensina que devemos amar nossos inimigos e orar por aqueles que nos perseguem. Na vida real, isso pode ser desafiador, mas é uma forma importante de superar o ódio e a raiva e promover a paz e a reconciliação.

• Generosidade e compaixão: Jesus ensina que devemos ser generosos em dar aos pobres e ajudar os necessitados. Na vida real, isso pode ser demonstrado por meio de voluntariado, doações ou simplesmente estendendo a mão para ajudar um vizinho ou amigo necessitado.

No geral, o Sermão da Montanha fornece ensinamentos que podem ser aplicados na vida real e que podem ajudar as pessoas a viver uma vida mais virtuosa e gratificante. É um desafio contínuo aplicá-los, mas pode ser uma grande fonte de inspiração e orientação para os cristãos.

Acabou de ler uma proposta de homilia para este domingo. Talvez tenha estranhado o estilo ou algumas particularidades diferentes da forma como habitualmente escrevo. O que leu foi feito em poucos minutos a partir de inteligência artificial computacional, num gerador de texto digital recente. Coloquei algumas palavras-chave em inglês (não quaisquer, admito o dedo humano, mas ao alcance de todos), depois submeti no google tradutor, ele próprio também uma máquina de inteligência artificial poderosíssima na arte de traduzir.  Apenas retirei a carga de tom brasileiro e eis um texto razoável sobre a vida cristã…

Os desafios são gigantes, misteriosos, inimagináveis, fascinantes e assustadores. Pela positiva, o incrível génio humano e as suas capacidades. Pelo lado sombrio, as implicações éticas de que apenas um pequeno véu se está a levantar. Há um lado pedagógico, ainda luminoso, que se pode retirar: a vida pastoral será certamente mais do que belas palavras, pois essas o computador pode gerá-las, rápida e “criativamente”. Falta o toque humano encarnado na vida e esse e apenas esse pode tocar. Há que questionar a dose do nosso latim. Em vez de gente palavrosa, como eu (e como as máquinas de geração de texto baseadas em inteligência artificial), precisa-se de quem escute, de quem abrace, de quem se meta e que meta a vida dos outros na vida de todos nós… na vida de Deus. É a bem-aventurança que importa.

JP in Sem categoria 30 Janeiro, 2023

Bem-aventurados os pobres de espírito

Na liturgia católica romana deste fim de semana escuta-se Mt 5, 1-12

«Bem-aventurados os pobres de espírito»

Em tempo litúrgico de bem aventuranças, destaquemos a pobreza espiritual, nem sempre bem compreendida, mas fulcral no cristianimso. Há uma dimensão de pobreza mais profunda, que ultrapassa o pão mas que só é conquistável por quem tenha um mínimo de pão: chamamos-lhe pobreza espiritual. É uma bem-aventurança de abertura em crer para nada querer. Percebe-se bem naquele conto oriental segundo o qual um mendigo pediu a uma pessoa de posses que lhe desse algo. Essa pessoa deu-lhe tudo o que tinha. No dia seguinte, o pobre voltou e retorquiu: “ensina-me a ser como tu. Dá-me a riqueza de que eu preciso, que é a capacidade de dar tudo o que tenho, como fizeste ontem comigo”. Compreendemos bem que haja gente (e as duas gentes estão dentro de cada um de nós…) que seja rica-pobre e pobre-rica… Bem-aventurados vamos sendo se soubermos viver nesta tensão, de extrair do ‘baixo’ tudo aquilo que ‘eleva’…

NOTA: Este texto é repetido/ajustado a partir de evento já publicado neste blog anteriormente.

DOMINGO IV DO TEMPO COMUM

L 1 Sf 2, 3; 3, 12-13; Sl 145 (146), 7. 8-9a. 9bc-10
L 2 1Cor 1, 26-31
Ev Mt 5, 1-12a

JP in Sem categoria 28 Janeiro, 2023

teólogos da segurança…

Os teólogos da segurança ficam arrepiados com as aproximações ecuménicas menos diferenciativas, assustados com o ‘tanto faz’ das religiões. Sim, há diferença nos caminhos espirituais da humanidade, mas, por submissão positiva à bondade universal e amorosa de Deus, há uma relativização da via religiosa-espiritual, que redunda quase nisso: salvação no trilho da boa vontade vertida nas possibilidade de cada pessoa e de cada cultura, um ‘quase-tanto-faz’, sim… (para positivamente escandalizar tal teologia securitária…)

JP in Sem categoria 26 Janeiro, 2023

Bíblia e violência

Sobre a violência latente em certas passagens da Bíblia não vejo alternativa a uma boa hermenêutica, sujeita à tensão das leituras macro e micro. Vejamos. O ‘macro’ da Bíblia é um Deus que quer salvar, que se vai revelando (no Novo Testamento, há um êxtase na morte e ressurreição de Cristo, que polarizam tal Deus num Deus de serviço, acolhimento e amor). Este é o macro, tudo o resto se entenderá para ‘tentar dizer o que este amor não se consegue dizer’. E a revelação opera-se na complexidade que somos, cheia de virtudes e potencialidades, mas assente na contingência dos nossos limites e das nossas pulsões violentas. Deus diz-se assim: “tu podes ser tu diante de mim”. Mas “eu sou também violência, interior e exterior”. A Bíblia tinha que espelhar estas tensões, sem perder nunca o foco de ser livro de salvação…

JP in Sem categoria 24 Janeiro, 2023

eles deixaram logo as redes e seguiram-No

Na liturgia católica romana deste fim de semana escuta-se Mt 4, 12-23

«eles deixaram logo as redes e seguiram-No»

A propósito desta descrição dos seguidores próximos de Jesus, fixemo-nos na prontidão da resposta ao apelo, que é sempre um convite tão mobilizador quanto libertador. A expressão “deixou logo as redes” pode ser inspiradora. Estar prontos para deixar o que pode ser deixado e atender os outros: deixar o ritmo de trabalho para atender melhor os filhos, deixar de ter algo, para partilhar, deixar um rancor para perdoar, deixar a televisão para conversar, e muitos mais auto-recados promissores, que esperam vida para se realizarem…

NOTA: Este texto é repetido/ajustado a partir de evento já publicado neste blog anteriormente.

DOMINGO III DO TEMPO COMUM

L 1 Is 8, 23b – 9, 3 (9, 1-4); Sl 26 (27), 1. 4. 13-14
L 2 1Cor 1, 10-13. 17
Ev Mt 4, 12-23 ou Mt 4, 12-17

JP in Sem categoria 22 Janeiro, 2023