Natal amanhã, Natal hoje
Se vai nascer, seja o que for, em certo sentido, já nasceu e nascerá. Há grande parte dos sonhos que já são realidade em movimento brotante, antes mesmo de se desvelarem na história do tempo.
Se vai nascer, seja o que for, em certo sentido, já nasceu e nascerá. Há grande parte dos sonhos que já são realidade em movimento brotante, antes mesmo de se desvelarem na história do tempo.
Na liturgia católica romana deste fim de semana escuta-se Is 7, 10-14
«O próprio Senhor vos dará um sinal»
Em tempos de Advento as leituras bíblicas colocam ênfase nos sinais que Deus deu, dá e dará ao seu povo. A nossa esperança reside na fé mas há sinais que vão confirmando os nossos passos, amparando os nossos “mergulhos”, dando luz aos nossos “saltos no escuro”. Há sinais à nossa mercê que precisam dum trabalho dos nossos olhos. Assim como quem pega num grão discreto de areia e nele pode ver cristais de beleza impressionante, também todos os rostos humanos, mesmo os mais rudes, são sinais de um Deus que criou, está a criar e assiste todos os homens.
Prosa relevante sobre o sonho
Há um primeiro e fundo instinto: o de viver, ou sobreviver, quanto mais tempo e em qualidade melhor.
Um segundo sonho me auto-transcende, me contém e me sustenta: o de dar a vida, quanto mais tempo e em qualidade melhor.
Não deixo de ser o primeiro mas a liberdade é do segundo.
A sobrevivência existencial do primeiro sonho é rasteira e choca no absurdo das mortes e incompletudes.
O Segundo sonho faz daquilo que falta ao mundo e que me falta a mim, a matéria prima da própria escultura que a transcendência esculpirá em mim e por mim.
Por isto, de manhã, acordo e agradeço. E procuro oferecer ao tempo e ao espaço que tenho essa essência, que nunca agarro mas que tateio em cada gesto amoroso.
06 de fevereiro de 2016
Em 1953 há um gesto simbólico da Igreja muito curioso: o Padre Leonard Feeney é excomungado da Igreja (excluído) por recusar a ideia muito própria do Concílio Vaticano II, segundo a qual “há salvação fora da Igreja”. As consequências são simples e podem reproduzir-se assim: “não há lugar na Igreja Católica Romana para quem entenda que não há salvação fora da Igreja”…
Na liturgia católica romana deste fim de semana escuta-se II Tg 5, 7-10
«Esperai com paciência a vinda do Senhor»
A Epístola de Tiago aponta-nos para a paciência como virtude central na fé. A par da persistência, do propósito, do exercício, do trabalho, da edificação, da ação, da vontade e da disciplina, a paciência é uma espécie de cenário de fundo crucial no dinamismo da crença e, porventura, o horizonte do Advento. Quando o mundo nos esmaga, quando nós próprios nos reconhecemos carentes (mesmo que crentes), quando constatamos dentro e fora de nós mecanismos de fuga do essencial (preços de liberdades…), eclode como urgência a mãe de todas as virtudes: a paciência. A paciência é também saber pisar o deserto, é saber estar. A paciência, a bem dizer, é o distintivo da fé.
O que a vida nos demanda é uma doce rendição: ativos, como se tudo dependesse de nós, mas rendidos, ganhando consciência da beleza da graça…
A evolução da religião é compreensivelmente lenta. Observe-se o caso da Igreja Católica: com cerca de dois mil anos de história, milhões de fiéis e, actualmente, cerca de meio milhão de padres e religiosos, tem uma inércia própria. A inércia, na sua raiz científica, relaciona-se com uma tendência que todos os corpos possuem para manter o seu estado (de movimento ou repouso). Quanto maior massa, maior inércia… Por outro lado, estes anos de história e tradição e este volume de pessoas e de conhecimentos, congregam uma sabedoria e um património que dão consistência e corpo à cultura humana, podendo ajudar a humanidade a ter Deus como referência fundamental.
Na liturgia católica romana deste fim de semana escuta-se Mt 3, 1-12
«Uma voz clama no deserto: ‘Preparai o caminho do Senhor, endireitai as suas veredas’»
Esta voz de João Batista que clama no deserto é, também, um símbolo de hoje. Pelo menos em dois aspetos: 1) o grito que damos ao olhar um mundo incompleto e insuficiente, carente e ainda violento e injusto; 2) o grito que podemos dar a nós mesmos, quando nos recolhemos e constatamos a nossa própria fragilidade e incompletude. Em ambos os casos, para fora e dentro de nós mesmos, é uma atenção à mudança que marca os tempos de Advento. Endireitar as veredas, começando principalmente pelo nosso interior, é o caminho a fazer, sempre sem auto-culpabilidade e pressão, antes com doçura e certeza de aceitação…
Na liturgia católica romana deste fim de semana escuta-se Is 2, 1-5
«O Senhor chama todos os povos à paz eterna do reino de Deus»
Em início de Advento, colocamo-nos na aprendizagem da esperança, na ‘fila’ de quem quer crescer. A expressão do livro de Isaías acentua a tónica numa chamada (numa ek-klesia): “O Senhor chama todos os povos à paz eterna do reino de Deus”. Observe-se a palavra “todos”, um aperitivo judaico, potenciado no cristianismo, que contempla a universalidade (a catolicidade) da proposta de encontro e comunhão. Um incentivo ecuménico e inter-religioso, a bem dizer. Que a ritualização e a pertença eclesial neste Advento sejam sempre potenciadas, resignificadas e vividas, tão só (…), para tentarmos ser melhores pessoas para o reino de Deus.
A escolástica tem papel fundamental na procura dialética entre fé e razão. Sem esquecer outros nomes, destaca-se São Tomás de Aquino, cujo legado é importantíssimo e insubstituível. Sem descurar nem relevar a escolástica (que até é mais uma metodologia do que uma teologia…) será muito difícil não valorizar nos nossos dias uma teologia literária. A Bíblia e a sua exegese, pela via literária, é, assim, radicalmente inspiradora e alavancadora de uma fé com sentido.