a Terra é um planeta poroso

Chandra Wickramasinghe afirma que há evidência crescente de que a vida na Terra teve origem fora do nosso planeta. Há uma atitude generalizada de resistência a esta hipótese, mas há́ também observações que a atestam cada vez mais: a astronomia continua a revelar a presença de moléculas orgânicas e de lixo orgânico numa escala cósmica imensa, correspondendo a um terço do carbono interestelar. Uma das hipóteses em cima da mesa é a de certas moléculas importantes na origem da vida terem chegado ao nosso planeta encapsuladas em “gaiolas moleculares” com propriedades parecidas com o famoso C60 (futeboleno). Estamos em procura mas há poucas dúvidas de que a Terra, ontem como hoje, é um planeta poroso no Universo…

JP in Ciência Frases Química 8 Agosto, 2019

ironia ao natural

Ironia ao natural

 

É natural,

é bom

e quanto mais melhor,

como os cogumelos

vermelhos,

as rãs azuis

ou o suco de serpente…

É químico,

processado,

é mau,

como a

aspirina,

um perfume

ou o plástico

da válvula

cardíaca

de um coração…

in Paiva, J. C., Quase poesia quase química (2012) (e-book). Lisboa, Sociedade Portuguesa de Química.

acessível aqui (porventura enriquecido com uma ilustração)

JP in Ciência Poemas Química 28 Junho, 2019

A Química da vida e a vida da química

O mundo à escala do muito pequeno é fascinante. Devolve-nos beleza, lógica e mistério, como quase tudo na vida, se afinarmos os olhos…

 

J. C. Paiva,A Química da vida e a vida da química. Site PontoSJ (que se recomenda…). 17 de agosto de 2018.

 

https://pontosj.pt/opiniao/a-quimica-da-vida-e-a-vida-da-quimica/

 

A Química da vida e a vida da química

Os químicos, além de tentarem compreender como são feitas “as coisas”, ocupam-se do dinamismo de como se transformam umas substâncias noutras. Vemos e tentamos tatear humildemente o mundo vivo e o mundo inanimado, aqui na Terra e por todo o cosmos (astroquímica). Parece haver uma maior densidade atómico-molecular mais perto de nós do que no rarefeito espaço sideral: estima-se que, ali, bem longe de nós, um centímetro cúbico de espaço não contenha mais do que um átomo que, assim sendo, só colide com outro, em média, de dez mil em dez mil milhões de anos (química lenta, de facto…).  À química interessam muito os humanos, quanto mais não seja porque, na realidade, se somos vida, somos constante transformação.

Química deriva da alquimia, prática antiga, pré-científica, que buscava a pedra filosofal, capaz de transformar metais vis, como ferro, em metais nobres, como ouro. Esta arte-magia tinha o seu quê de transcendente pois o elixir em procura, uma vez ingerido por humanos, transmutá-los-ia a eles mesmos para a eternidade. Hoje soa-nos a estranho mas ontem moveu muitos, incluindo notáveis cientistas como Newton. Da alquimia herdamos, entre outras preciosidades, as manipulações laboratoriais que ainda hoje praticamos nos espaços químicos. Notar que a expressão quimia quer dizer, precisamente, verter. Não fosse a química a ciência das misturas…

Uma das maravilhas da química é a aproximação à ideia de que toda a realidade, complexa e diversa, nas suas cores, formas, estruturas e demais propriedades, se faz à custa, apenas, de uma centena de unidades estruturais (elementos químicos). Estes diferentes tipos de átomos estão organizados numa tabela magnífica, que dá pelo nome de Tabela Periódica dos Elementos e que, de alguma forma, é a coleção dos bilhetes de identidade de cada um dos átomos que dá cor e vida e todo o cosmos.

A bem dizer, para o que anda à nossa volta, a começar por nós mesmos, basta até pensar numa vintena de tipos de átomos: com partículas do elemento hidrogénio, oxigénio, carbono, ferro, magnésio, cálcio, sódio e uns tantos mais, mapeamos o nosso organismo. É como as letras do alfabeto: assim como com vinte e seis letras apenas, organizadas coerentemente, se organizam palavras, frases textos e livros, também com cerca de vinte elementos diferentes, arrumados e congregados coerentemente, se constrói toda a diversidade de matéria que nos circunda… e nós mesmos…

São interessantes as analogias que podemos fazer entre a química e as nossas vidas. Com alguma imaginação, podemos fazer pontes curiosas entre o que somos, como nos relacionamos e o mundo dos átomos e das moléculas. Se nos concentrarmos nos átomos, constatamos que os materiais apresentam as suas propriedades em função da forma como as suas  partículas constituintes se ligam: ligações mais fortes podem determinar materiais porventura mais duros ou rígidos, porventura sólidos à temperatura ambiente. Já átomos ou moléculas (conjuntos de átomos) mais fracamente ligados e com maior mobilidade, podem ser constituintes de um gás que, em todo o caso, se for sujeito a baixíssimas temperaturas, pode passar ao estado liquido ou mesmo sólido. Pensemos no vapor de água que pode liquefazer ou mesmo ficar gelo, à medida que a temperatura baixa e as moléculas de “H2O” diminuem a sua agitação e a sua mobilidade. Facilmente entendemos como a expressão popular ou a literatura se podem apropriar destes conceitos: relações humanas sólidas e fortes… ou gente fugidia, gasosa e fracamente ligada.

As pessoas em relação procuram uma distância crítica ótima, que nem sempre se consegue: há um perigo claro de ligações “fortes de mais”, sem mobilidade e, portanto, de posse e até de coisificação. E importa a “temperatura das relações”. Esta, tanto pode ser alta de mais, a ponto de, na sua emotividade, destruir as ligações e fazer de tudo um fluido sem vigor, como pode, por outro lado, ser de tal forma uma temperatura baixa, que a rigidez impera e a reatividade baixa de tal forma que nada acontece e tudo fica na mesma.

Muitas das ligações entre partículas estabelecem-se por partilha de algumas entidades (eletrões) e pelo equilíbrio de forças que atraem e repelem partículas de carga elétrica positiva ou negativa. É belo este sinal da natureza nanoscópica: muitas das ligações fortes, como as que se estabelecem entre os átomos de carbono no reluzente diamante, acontecem por partilha (de eletrões) que, em certo sentido, deixam de ser do átomo x ou y e passam a (co)valer para o conjunto todo, bem ao jeito da proposta explícita no Evangelho para os primeiros cristãos. Se ninguém ‘chamava a nada seu’, era essa mesma marca da partilha que ligava e dava unidade, estrutura e sentido. Afinal, a partilha, será, porventura, o elixir da eternidade.

O mundo à escala do muito pequeno é fascinante. Devolve-nos beleza, lógica e mistério, como quase tudo na vida, se afinarmos os olhos…

 

espaço sideral rarefeito

É impressionate o facto de, no espaço sideral interestelar, haver cerca de uma partícula por centímetro cúbico. Com este espaço tão rarefeito, estima-se que a colisão entre partículas ocorra de 10 em 10 milhões de anos. Química fugaz, imensidão de quase vazio… Torna-nos pequenos, a nós e à nossa escala…

JP in Ciência Frases Química 28 Março, 2019

cem mil milhões

Cem mil milhões, como escala de grandeza, é um número simbólico no Universo: há (cerca de…) cem mil milhões de galáxias, cada uma com (cerca de) cem mil milhões de estrelas. Há (cerca de) cem mil milhões de neurónios num cérebro humano. Há (cerca de) cem mil milhões de conformações possíveis (orientações relativas dos átomos) em muitas proteínas…

JP in Ciência Frases Química 4 Fevereiro, 2019

acaso e necessidade…

No seu mistério amoroso, permito-me imaginar que o nosso Deus, que não quis ser marioneteiro, arriscou tecer – está a tecer – em fios de acaso e necessidade.

O astrónomo Jesuita George Coyne, disse a este propósito: “Dois átomos de hidrogénio encontram-se no início do universo. Por necessidade (leis da combinação química), eles estão destinados a tornarem-se uma molécula de hidrogénio. Mas por acaso, as condições de temperatura e pressão naquele momento não são as que permitem a combinação. Os dois átomos movem-se no universo até que finalmente se combinam. E há triliões e triliões destes átomos no mesmo processo. Pela interacção de acaso e necessidade forma-se muitas moléculas de hidrogénio as quais, finalmente, se combinam com moléculas de oxigénio tornando assim possível a água, e assim por diante, até chegarmos a moléculas muito complexas e, finalmente, aos organismos mais complexos que a ciência conhece: o cérebro humano”.

futeboleno

NOTA: O futeboleno é um composto químico muito interessante. Foi sintetizado laboratorialmente mas conhecessem-se vestígios não artificias no espaço. É composto por 60 átomos de carbono, disposto como numa bola de futebol… daí o seu nome…

Compostos semelhantes ao C60 resultam em materiais tão duros que riscam o diamante. O diamante, composto também constituído apenas por átomos de carbono, perde, assim, o estatuto do mais duro material existente…

 

Futeboleno

 

Criado

existente

no espaço

(além Sol)

presente…

Magia,

bola de

futebol.

Pentágonos,

hexágonos,

invenção

pré-existente.

Fascínio

verdade

nano-utilidade…

Potente

futuro

sagaz

elementar

e galante.

Tão duro

capaz

de riscar

diamante…

in Paiva, J. C., Quase poesia quase química (2012) (e-book). Lisboa, Sociedade Portuguesa de Química.

acessível aqui (porventura enriquecido com uma ilustração)

JP in Ciência Poemas Química 28 Outubro, 2018

a química e a pressa

A química e a pressa

 

A pressa

é o pecado

do mundo.

Pecar,

fazer mal a mim

e a ti,

é não esperar

e catalisar

o que tinha

mecanismo

previsto

com aquela ativação.

Para quê

baixar em força

aquele valor?

Mais valia deixar,

deixar em amor.

Subir como criança

a brincar

que vai ao alto e,

passando a barreira,

ali contempla

confia e delega.

E desce a rir

…como num escorrega…

in Paiva, J. C., Quase poesia quase química (2012) (e-book). Lisboa, Sociedade Portuguesa de Química.

acessível aqui (porventura enriquecido com uma ilustração)

 

JP in Ciência Poemas Química 16 Outubro, 2018

Porque Pirilampiscam os Pirilampos?… E muitas outras perguntas luminosas sobre química

Livro editado pela Gradiva, em co-autoria com Carla Morais

Referência: C. Morais, J. C. Paiva, Porque Pirilampiscam os Pirilampos?… E muitas outras perguntas luminosas sobre química. Gradiva, Lisboa, 2014

Para adquirir o livro contactar: www.gradiva.pt

Nota: neste blog, pode haver pequenos textos constantes do livro, com etiquetas, disponibilizados ‘avulso’.

 

A ciência ao alcance de todos, neste livro acessível, prático e esclarecedor. Recheado de factos curiosos e respostas aos mais intrigantes fenómenos, será apreciado pelos miúdos e graúdos que querem saber como funciona o mundo à sua volta. Uma bela edição, apelativa e informativa.

Porque Pirilampiscam os Pirilampos, usando de empréstimo a criativa palavra inventada por Mia Couto, é umas das curiosidades abordada neste livro de divulgação de química. Para miúdos e graúdos, em linguagem simples e acessível, abordam-se os mais variados temas da química do dia-a-dia: dos pirilampos à cozinha, passando pelos plásticos, pelo perfume e pela chuva. Numa viagem plena de desafiantes “porquês”, apresenta-se a química como uma ciência central. O funcionamento do ozono estratosférico como filtro solar, a utilização de bioetanol, biodiesel e biogás como possíveis soluções energéticas, as indesejáveis dioxinas e furanos, bem como o prometedor grafeno e os novos materiais, são assuntos-matéria-prima para a construção de perguntas e de alguns trilhos de resposta.

A química está por todo o lado e é fascinante saber como são as coisas e como se transformam umas nas outras. O conhecimento científico abre horizontes e estimula a vida. A química, de entre todas as ciências, é umas das mais determinantes na evolução da qualidade de vida e uma das mais estimulantes para o espírito. Com 38 questões, pistas para lhes responder e novas questões que, a propósito, se levantam, tenta fazer-se um pouco mais de luz. Vale a pena espreitar e descobrir porque pirilampiscam os pirilampos… e muitas outras questões luminosas sobre química!

 

índice:

Porque foi importante a alquimia? ………………………………………. 11

Porque é a química uma ciência central? ………………………….. 15

Porque é a tabela periódica importante? ………………………….. 19

Porque vem o elemento 117 preencher uma lacuna? ………. 23

Porque tem o carbono um lugar de destaque na química? 27

Porque são elementos como Fe, Mg, Ca, Na, K e Zn essenciais à vida? ……………………………………………………………… 31

Porque se usa o frigorífico para conservar os alimentos? …. 35

Porque são tão utilizados os plásticos? ……………………………… 39

Porque sentimos o cheiro de um perfume logo que abrimos o frasco? ………………………………………………………………. 43

Porque se fala em «química verde»? ………………………………….. 47

Porque se danificam algumas peças de ferro? …………………. 51

Porque são importantes as combustões? …………………………. 55

Porque se formam incrustações calcárias? ……………………….. 59

Porque funciona o ozono estratosférico como filtro solar? 63

Porque é o amoníaco uma importante matéria-prima? ……. 67

Porque é necessário purificar a água? ………………………………. 71

Porque têm os cristais de neve uma forma hexagonal? ….. 75

Porque podem rebentar as canalizações nos dias frios de inverno? ………………………………………………………………… 79

Porque é constituído por vidro o «núcleo» da fibra ótica? …. 83

Porque se faz a destilação do petróleo bruto? …………………. 87

Porque são o bioetanol, o biodiesel e o biogás possíveis soluções energéticas? …………………………………….. 91

Porque se utilizam as panelas de pressão para cozinhar os alimentos? ……………………………………………………… 95

Porque se diz em química que não há venenos, mas doses venenosas? …………………………………………………….. 99

Porque é que a salinidade do mar não se deve apenas ao cloreto de sódio? ………………………………………………………….. 103

Porque é o diamante um material com elevada dureza? …. 107

Porque é condicionada pela química da atmosfera a vida na Terra? ………………………………………………………………….. 111

Porque pode ter cor o fogo de artifício? ……………………………. 115

Porque sobe o pH da pele quando é lavada com sabão? 119

Porque existem chuvas ácidas? ………………………………………….. 123

Porque se utilizam processos de eletrólise? …………………….. 127

Porque são indesejáveis as dioxinas e os furanos? …………. 131

Porque pirilampiscam os pirilampos? …………………………………. 135

Porque se forma o «nevoeiro fotoquímico»? …………………….. 139

Porque é utilizada em medicina a radiação gama? ………….. 143

Porque se utiliza RMN em química, biologia e medicina? …. 147

Porque é o grafeno um material interessante? …………………. 151

Porque são importantes os «novos materiais»? ………………… 155

Bibliografia …………………………………………………………………………….. 159

 

Um exemplo:

Porque pirilampiscam os pirilampos?

 

Muitas reações de combustão produzem luz, decorrente da elevação da temperatura. Estas reações libertam energia como calor, suficiente para aquecer a mistura reacional até à incandescência. Em contraste, outras reações libertam energia luminosa à temperatura ambiente. A produção não térmica de luz visível por uma reação química está na origem do termo «luz fria» e o processo é chamado quimioluminescência. Para ser quimioluminescente, a reação tem de disponibilizar energia de excitação suficiente para que, pelo menos, uma espécie química possa ser transferida para um estado eletrónico excitado. Quando a produção de luz visível ocorre em organismos vivos, o processo designa-se por bioluminescência.

A bioluminescência pode ser utilizada pelos organismos como forma de camuflagem, na atração de presas ou potenciais parceiros, na repulsão de predadores, em comunicação e iluminação.

O mais conhecido dos organismos bioluminescentes é, sem dúvida, o pirilampo (do qual há vários milhares de espécies diferentes).

Numa reação bioquímica no corpo do pirilampo, a enzima luciferase catalisa a oxidação da luciferina por uma molécula de oxigénio. A decomposição térmica do produto da oxidação produz radiação eletromagnética.

A bioluminescência ocorre em vertebrados e invertebrados marinhos, bem como em microrganismos e animais terrestres. Assim, além dos pirilampos e de várias espécies de insetos, outros organismos, como bactérias, algas, celenterados e crustáceos, também manifestam a ocorrência do fenómeno de bioluminescência.

A emissão de luz por várias plantas e animais é conhecida desde os primórdios da humanidade. Contudo, apenas no século xx aumentou gradualmente a investigação nesta área, com a descoberta de muitos sistemas quimioluminescentes.

Os sistemas mais comuns envolvem o luminol, ésteres do ácido oxálico, lucigenina, tris(bipiridil)ruténio(II) ou luciferina.

 

JP in Ciência Livros Química 26 Julho, 2018

A química das relações: pais, filhos e a escola…

Paiva, J. C, A química das relações: pais, filhos e a escola…. Revista leya-educação (on line), março, 2018.

 

Disponível em https://www.leyaeducacao.com/z_escola/i_376

A química das relações: pais, filhos e a escola…

A química, como ciência das propriedades e transformações da matéria, tem uma das suas bases fundamentais na interpretação de fenómenos macroscópicos (visíveis a olho nu) a partir do comportamento dos pequeníssimos corpúsculos que constituem todo o universo, incluindo cada um de nós. Se ainda não reparou, nós somos química em ação!

Serve o contexto químico acima para nos situarmos – a partir do fascinante mundo da química – no dinamismo daquilo que somos. As analogias da química com a vida tal e qual são impressionantes, não fosse a química a ciência das misturas. Os átomos e as moléculas ligam-se mais ou menos, desligam-se e agitam-se… e assim dançam no tempo. A química espelha, por extrapolação, as relações humanas e aquilo que nós próprios somos: forças, ligações, oposições, atrações, repulsões, transformação, reação… E se nos situarmos na complexa triangulação pais-filhos-escola temos a química no seu esplendor: mistura (às vezes explosiva…) de potencial ligante!

A gestão da distância crítica destas relações entre os encarregados de educação, os seus educandos e a realidade escolar é de grande centralidade. Assim como na química há iões complexos (partículas de carga com estruturas menos simplificadas), assim também este triângulo relacional é, no mínimo, complexo. Temos uma escola aberta e por inerência vital dessa condição que conquistámos e não queremos perder, a escola (então um sistema aberto, como muitos dos sistemas químicos) troca matéria e energia com o que a rodeia.

Talvez possamos refletir sobre a sensibilidade do sistema face ao encontro da distância crítica ótima dos seus vários agentes, por observação dos seus exageros e caricaturas, infelizmente não raros na química das nossas escolas:Há escolas, professores e sistemas educativos (inclusive políticos) que têm medo dos encarregados de educação (se estes forem professores, ainda mais…).
Há encarregados de educação que ocupam demasiado espaço no contexto escolar, protagonizando onde não é suposto e assumindo um papel de policiamento dos professores e da vida escolar, que não é nem justo nem pedagogicamente fecundo.
Há pais com distâncias críticas muito curtas face aos seus filhos e ao seu percurso escolar (umbilicalidade que adia teimosamente a desejada autonomia) e, não raras vezes, muitíssimo preocupados com o contexto académico do aproveitamento e pouco incomodados com o alinhamento ético do que mais importa na educação.
Há encarregados de educação que entendem que “é à escola que cabe educar” e se demitem das mais elementares funções, as mais radicais das quais se praticam na família.

Como em muitos dilemas educativos, casos particulares dos dilemas da vida, procuramos um justo equilíbrio entre dois polos (mais uma vez, em ponte analógica com cargas elétricas em átomos e moléculas): a) há professores que se fecham ou abrem de mais; b) há pais que se aproximam ou afastam de mais; c) há alunos que esperam ou desesperam de mais.

Há quem chame à química a “ciência dos eletrões de valência”. Isto porque nas ligações químicas, os átomos tendem a preservar o seu cerne central e partilhar os seus eletrões (livres) que, em muitos casos, por essa radical partilha, deixam de ser seus. Seria esta uma boa analogia para os pais verem os seus filhos? Serão mesmo livres os nossos descendentes? Muitas vezes, os pais entendem, no plano intelectual, que cultivam a liberdade na educação mas, na primeira oportunidade, prendem-nos em ratoeiras de expectativa, de condicionamento, de narcisismo e de projeção da sua imagem própria (digo que quero que tenhas boas notas para o teu bem mas o que me move verdadeiramente é a minha imagem de pai ou de mãe de filho com boas notas…). Outras vezes os eletrões estão de tal maneira livres (assim acontece nos metais) que são libertinos, não possuem qualquer identidade de ligação e, como tal, não podem ter o toque amoroso de serem cuidados. Tudo isto se projeta nas relações escolares dos encarregados de educação e por tudo isto compreendemos que é tão desafiante quanto enorme a obra da educação. Valha-nos o dinamismo das transformações químicas e a mais elementar humildade e abertura ao crescimento de cada um: para pais, filhos e professores, para todos, educar é educar-se!

JP in Educação Química Textos 3 Julho, 2018