revelação e liberdade humana
A revelação de Deus só se realiza plenamente na ontológica aceitação da liberdade humana
A revelação de Deus só se realiza plenamente na ontológica aceitação da liberdade humana
Na liturgia católica romana deste fim de semana escuta-se Mt 2, 1-12
«regressaram à sua terra por outro caminho»
Em celebração de “dia de Reis”, já depois do Natal, há vestígios ainda de “conversão”, no melhor sentido dos termos, isto é, como mudança de vida. O simbolismo dos Reis Magos terem “regressado por outro caminho” é forte: significa que aquele encontro especial (com um sentido, com O sentido…) os fez mudar trajetórias. Talvez uma das maiores riquezas da ritualização espiritual seja o radical e sistemático convite à novidade, ao confronto, à mudança de trajetória, ao “regresso por outro caminho”. Na imagem e no âmago da Igreja, nem sempre vislumbramos este espírito de mudança… Era bom cultivarmos interiormente a disponibilidade de nos tocarmos, de nos co-movermos, quando visitamos alguém, quando ensaiamos novos cenários, quando nos entregamos a novos encontros. E, diante dessas novidades, das novidades da vida, alvitrar outros regressos…
L 1 Is 60, 1-6; Sl 71 (72), 2. 7-8. 10-11. 12-13
L 2 Ef 3, 2-3a. 5-6
Ev Mt 2, 1-12
NOTA: Este texto é repetido/ajustado a partir de evento já publicado neste blog anteriormente.
Agostinho da Silva tem uma etimologia falsa muito curiosa: pegar numa criança, parti-la ao meio e meter um pedaço de adulto é … adulterar…
Albert Camus, ao expressar que “a moderação não tem que ser morna”, oferece-nos um trilho que contempla a radicalidade (ligação às raízes) e o equilíbrio sistémico…
Na liturgia católica romana deste fim de semana escuta-se Ben-Sirá 3
«Aquele que teme a Deus honra os seus pais»
A Igreja celebra a festa da família, inspirada na própria família de Jesus. A ver pela leitura do Evangelho que se lê hoje, a família de Jesus não era isenta de tensões, de desencontros e de perdas…
O livro de Ben-Sirá apresenta-nos uma proposta de coesão familiar que marca a tradição judaico-cristã e tem grandes repercussões sociais e de organização política: “honrar os pais”.
Vamos assumir que “honrar os pais”, na sua forma mais explícita, é um apelo ainda urgente para o apoio à terceira idade, para o acolhimento dentro e fora da família dos mais frágeis, para a não descartabilidade, para o cuidado. Mais ainda, o jeito cristão de honrar Pai e Mãe supera a consideração e o sentido crítico (até as feridas) dos progenitores. Mesmo aí, o convite é para amar. Porém…
É útil, contudo, refletir sobre uma maior profundidade deste tema, sem moralismos e convocando a (holísticamente libertadora) proposta cristã.
A sabedoria da vida e a própria reflexão da ciência psicológica chamam-nos à atenção para a complexa teia familiar e para os intrincados laços, conscientes e inconscientes, das relações entre pais e filhos. Neste sentido, o de uma interpretação não só histórico-crítica mas também sistémica, os textos da Bíblia são ainda mais radicalmente não literais. Vejamos: se os pais forem bastante possessivos, castradores, chantageadores e manipuladores (e muitos assim há, mais novos ou mais velhos), não poderá ser uma libertação (para os filhos, para os pais e para as relações) romper, cortar, afastar? (apesar de ‘os ter no coração’).
Imaginemos uma Mãe ou um Pai de perfil narcisista, por isso mesmo com grande potencial “des-libertador” dos filhos. Não tendo cerimónia na linguagem, para facilitar, vamos chamar a este perfil de pais (nem por isso muito raro) “monstros”. Para suavizar (…), assumamos que todos nós, pais, temos um pedaço de “monstro” dentro de nós… A pergunta, que pode inspirar muitos filhos (todos nós) e até fazer-nos refletir enquanto ajudadores de sofrimentos familiares, é esta: alimentar o monstro é honrar os pais? Não seria maior ‘honra’, para a vítima, para o perseguidor, para a relação e para o mundo, quebrar, enfrentar, colocar os pontos nos “i”s?…
É claro que o “jeito cristão” de promover estas ruturas haverá de reservar no coração um lugar de retoma, não veicular ódio, estimular o perdão. Mas nenhum destes propósitos muitos cristãos deve tanger qualquer moralismo submisso. Honrar Pai e Mãe é caminhar em família para uma verdade que liberte e tal poderá incluir assertividades agudas, definição de fronteiras e até ampliação de distâncias: críticas, relacionais, temporais e geográficas…
Para toda esta gestão não fácil das redes familiares há que fazer um discernimento contínuo, “contar armas”, avaliar sistemática e corajosamente. Muitas vezes, há uma competição de amores e muitos poderão, por exemplo, ter de “arrefecer” a atenção aos pais, para poderem responder a outras demandas, como o cuidado da conjugalidade e dos próprios filhos. Não há super-homens, nem super-mulheres, nem super-pais nem super-filhos. Em todos os casos, a honra é a procura de uma verdade que liberte…
Este texto é adaptado em parte ou na totalidade de palavras anteriores já publicadas.
L 1 Sir 3, 3-7. 14-17a (gr. 2-6. 12-14); Sl 127 (128), 1-2. 3. 4-5
L 2 Cl 3, 12-21
Ev Lc 2, 41-52
Os apontamentos morais podem ser interessantes, mas terão sempre de se sujeitar ao ‘dogma maior’ do amor e da liberdade. Se o jurídico ou o religioso não servem o amor e a liberdade, então não servem…
Talvez este dia possa ser saboreado assim, como se fosse um propósito de processo contínuo: espera alegre. Depois, viver em Natal…
Natal 2020
Seja esta festa para todos e para cada um, a festa da ‘normalidade do espanto’.
O espanto do amor que tudo excede e a normalidade frágil e potente que somos nós.
O Belo fez-se versão humana para que o humano seja Belo.
O que falta fazer é o véu de mistério que nos permite antever, fazer e ser o desafio maior da nossa existência.
…E o resto da história está a fazer-se com as nossas vidas que, dando vida, realizam a Vida no mundo.
Na liturgia católica romana deste fim de semana escuta-se Lc 1, 39-45
pôs-se a caminho
Em tempos de Advento recentramo-nos em Maria, que explicita três aspetos fundamentais: fé, aceitação e risco. Maria colocou os meios ao serviço da sua missão: saiu do sofá e foi ter com alguém… a quem ajudou e através de quem foi ajudada. Seduz-nos este estilo de Maria, singelo, alegre e descomplicado. Muitas vezes estamos bloqueados e não nos colocamos a caminho. Notar que também aí Deus está connosco. Ele não está presente com condições e como resultado dos nossos méritos, mas porque nos ama, sempre. Com esta confiança, podemos também fazer a nossa parte e buscar os recursos que precisamos para ser o que podemos ser. Raramente o conseguimos sozinhos. Há neste texto um duplo movimento, inspirado em Maria: pedir ajuda sempre que precisamos, indo ao encontro das pessoas certas, que nos acolhem como nós somos. Por outro lado, sermos também nós abertos a sermos ajudadores de quem nos procura…
Este texto é adaptado em parte ou na totalidade de palavras anteriores já publicadas.
L 1 Mq 5, 1-4a; Sl 79 (80), 2ac e 3b. 15-16. 18-19
L 2 Heb 10, 5-10
Ev Lc 1, 39-45
Chama se quiasma à figura de estilo com elementos semânticos de forma cruzada. Tenho certa simpatia por este, que um dia me ocorreu, como duplo quiasma:
“sair da prisão de fazer o que quero e prender-me à liberdade de querer o que faço”